quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

O LADO NEGRO DO INSTAGRAM


O último post aqui publicado foi sobre a atitude positiva do youtuber Felipe Neto a respeito da artista mirim Melody (veja aqui).

Nesse meio turbulento de influenciadores digitais, infelizmente, as boas atitudes ainda constituem pontos isolados, em um panorama repleto de farsantes imbuídos das piores intenções.

É o que mostra o documentário Fyre Festival - Fiasco no Caribe (2018), atualmente disponível na Netflix.

Se o exemplo demonstrado por Felipe Neto, por um lado, nos mostra que o bom senso pode preponderar no meio digital, por outro lado, vemos que quando existe a total  ausência dele, tudo pode "dar ruim", para um monte de gente...

A história que o filme conta já se tornou popular pra quem frequenta muito as redes sociais desde 2017, ano de acontecimento dos fatos: o jovem e promissor empresário do ramo de cartões de crédito Billy McFarland, um playboy com apenas 26 anos na época, após engatar uma amizade barulhenta com o rapper doidaço e figurinha da mídia norte-americana Ja Rule, simplesmente inventa de organizar o que seria o festival dos festivais de música, o Fyre Festival, um verdadeiro evento multimidiático com tudo o que você poderia pensar - de tendas na praia e buffet milionário entremeados por apresentações de música, até jogos no estilo 'caça ao tesouro' - em uma ilha isolada no Caribe... que teria pertencido ao mega traficante colombiano Pablo Escobar!
Billy McFarland: o maior vigarista digital que o mundo já conheceu

Muito som dançante, muita bebida, comida, lindas mulheres e uma galera jovem, rica e descolada, num verdadeiro hype que iria bombar nas redes e entrar para a história, se repetindo anualmente - assim como o Coachella, Tomorrowland e outros festivais marcantes.

Falando assim, a ideia já parece muito louca.

Mas loucura era apelido para McFarland e a equipe de devassos que ele montou para dar vazão às suas aspirações megalomaníacas.

Pra início de conversa, ele se cercou de um bando de inexperientes e incompetentes, cujas mentes pareciam viver somente para bebedeiras e raves eternas. O mané contratado para levar e trazer o pessoal da ilha num aviãozinho fretado por McFarland tinha aprendido a pilotar no aplicativo simulador de vôo da Microsoft, sem muitas horas de prática numa cabine real, e do nada, adorava deixar o veículo em gravidade zero. Insano.

Desde o início do documentário, já somos levados a acreditar piamente que aquilo não podia de maneira alguma dar certo. Para quem gosta de assistir a um mal feito, recomendo demais esse filme - as gargalhadas são certas.

O evento era gigantesco demais para pessoas com pouca ou nenhuma experiência em organização de coisas desse tipo, como aqueles caras. Mas aí entra a parte perigosa da trama, e que acabou realmente envolvendo McFarland e sua trupe em maus lençóis: a divulgação online do Fyre.

Queridinho e super influente no Instagram, o cara comercializou o apoio ao seu festival em 'likes' de algumas das mais famosas modelos e celebridades do mundo. Além de gerar uma monetização absurda em propagandas e publicidade para o Fyre, ele oferecia permuta a vários outros influenciadores digitais, conseguindo divulgação para o seu evento em troca de passaportes e instalações na ilha. Detalhe: sem ter ainda organizado ou construído NADA do que estava oferecendo.

Ou seja, o que tinha de doido, tinha de trambiqueiro também. E isso iria lhe causar sérios problemas com a justiça dos EUA...

As loucas propagandas do Fyre bombaram nos perfis de Instagram em 2017

A primeira uma hora do filme nos acompanha por esses episódios absurdos que foram conduzindo McFarland e sua trupe rumo à concretização do "sonho". 

Lances sinistros do marketing do festival mostram como, por exemplo, um quadrado alaranjado simbolizando o festival foi parar no perfil de Insta de algumas das mais famosas modelos do mundo, e atingindo milhões de curtidas num só dia, em coisa de minutos. É tragicômico.

A partir de certo momento, então, é mostrada a derrocada da santa ilusão.
A famosa foto do sanduíche de queijo que viralizou na web, mostrando o nível da alimentação oferecida no evento e acabando com a moral do Fyre Festival

O dono da ilha que pertencera a Pablito empomba com a menção do nome do traficante no merchan do evento, e desautoriza o seu uso. Não há suporte de alimentação do restaurante responsável por cuidar da comida, que pula fora na última hora. Tampouco há infraestrutura mínima de luz, água e internet para o novo local escolhido (um pedaço de outra ilha, chamado Great Exumas). Os containers de água contratados para chegar ao local perigam não ir por conta de um problema com a alfândega - entrave que um dos asseclas de McFarland, um pobre senhor homossexual chamado Andy, é incumbido de resolver de um modo "especial", em uma das passagens mais infames do documentário. 

McFarland e seus organizadores começam uma tresloucada e psicótica corrida contra o tempo para fazer o show acontecer. E começa a dar exatamente TUDO errado.

Logo ficamos sabendo que o Fyre Festival não passa de um grande embuste de Billy McFarland - revelado então como, talvez, o maior vigarista que a era digital já produziu até o momento.
Resultado dos delírios de grandeza de McFarland, o festival resultou num descampado de tendas detonadas pela chuva e vento, estruturas desmontadas e desolação

Nenhuma das bandas escaladas para tocar no festival estavam de fato contratadas para o mesmo, e passam a se desculpar com o público na web. A farsa - antes cogitada por alguns empresários de New York e suspeitada por um dos funcionários do festival que iria cuidar da meditação de ioga dos participantes - se torna bem evidente para todos.

Quando o público pagante começa a chegar de avião na ilha para o evento, e se deparam com a realidade do que encontram por lá, a cortina cai e o desastre se consuma. Na noite anterior, para completar o caos reinante, uma chuva pesada havia devastado o lugar...

Nem tudo faz rir na história grotesca do Fyre Festival: o final do filme mostra como essa bagunça de empreendimento atingiu vários moradores locais de Great Exumas, contratados a toque de caixa para tentar montar toda a estrutura do evento, trabalhando direto por muitos dias e noites, sem o devido descanso e alimentação necessárias, e o pior, levando o cano depois de tudo isso, sem receberem um centavo do que lhes era devido.

Post de quem foi ao primeiro dia do evento: "Então o Fyre Festival é um desastre completo. Caos em massa. Nenhuma organização. Ninguém sabe pra onde ir. Não há acomodações, apenas uma desastrosa cidade de tendas." 

É de dar dó o relato comovente da dona do principal restaurante da localidade, também lesada pelos delírios de grandeza de McFarland e seu festival.

Em suma: Fyre Festival é o perfeito retrato de como são perigosas as ilusões virtuais criadas por aproveitadores para enganar pessoas no mundo real.

Um verdadeiro alerta vermelho para esses tempos repletos de picaretas digitais, em que estamos vivendo.

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